O artigo procura apreender e esboçar as condições e circunstâncias imanentes à necessidade que leva uma sociedade a individualizar e subjetivar atos e comportamentos e a considerá-los passíveis de responsabilização pelas eventuais consequências nocivas que trariam. Para tanto, sinalizamos um traçado das linhas de força que colocam o problema não genericamente, partindo de valores abstratos sustentados como modelos universais de conduta, e sim desde tipos ou modos de vida dos homens que sentem, pensam e agem em função da continuidade de seus desejos e demandas em sociedade. Distinguimos inicialmente a ideia de responsabilidade desde a imagem que a preenche e da palavra que a simboliza, reencontrando o puro conceito. Remetemos o conceito ao problema ao qual responde concretamente. Problematizamos o próprio modo de colocar o problema, remetendo-o a um campo problemático de relações de forças. Apreendemos nesse campo de forças as modalidades imanentes de vida que nele se preenchem e se projetam nos valores sustentados como solução ou saída. Colocamos o problema, então, do tipo de vida que se investe e se colhe como retorno, o que engendra novos processos ou devires que dignificam ou empobrecem as forças constitutivas da vida e condicionam os meios de superar a humanidade reativa em nós.
Transcrição da palestra proferida por Luiz Fuganti no 1º CULPSI – Cultura & Psicologia, evento realizado pelos estudantes de psicologia da Faculdade de Tecnologia e Ciências (campus de Vitória da Conquista, Bahia) entre os dias 02 e 04 de maio de 2007
Vou esboçar algumas questões relativas ao biopoder e à saúde e, nos limites desse breve discurso, considerar alguns aspectos acerca do controle sobre a vida e do sentido daquilo que comumente se denomina cuidado. Em seguida, qual a relação desses aspectos do controle e do cuidado com as práticas de medicalização que constituem, me parece, uma nova demanda por um certo valor de saúde. Porém, não um valor de saúde que se produz a partir de um tipo ativo de vida, mas aquela saúde que se demanda e acontece como investimento de desejo de um tipo de vida separada de suas capacidades de criar as próprias condições do existir.
“Talvez um dia o século será deleuziano”, assim falou Michel Foucault numa ocasião, depois do extraordinário impacto que lhe provocou a leitura de duas obras que marcaram para sempre, não só o século 20, mas toda a história do pensamento humano: Lógica do Sentido e Diferença e Repetição, de Gilles Deleuze. Essas obras por si só mostra toda singularidade e diferença de uma pura potência do pensamento.
Gostaríamos inicialmente de saber qual é atualmente o objeto do seu pensamento. Acompanhamos os seus últimos desenvolvimentos, principalmente os seus cursos no Collège de France em 1981/1982 sobre a hermenêutica do sujeito, e queríamos saber se o seu procedimento filosófico atual é sempre determinado pelo pólo subjetividade e verdade.
Esse sempre foi, na realidade, o meu problema, embora eu tenha formulado o plano dessa reflexão de uma maneira um pouco diferente. Procurei saber como o sujeito humano entrava nos Jogos de verdade, tivessem estes a forma de uma ciência ou se referissem a um modelo científica, ou fossem como os encontrados nas instituições ou nas práticas de controle. Este é o tema do meu trabalho As palavras e as coisas, no qual procurei verificar de que modo, nos discursos científicos, o sujeito humano vai se definir como indivíduo falante, vivo, trabalhador. Nos cursos do Collège de France enfatizei essa problemática de maneira geral.
Spinoza nasceu em Amsterdã (Holanda) em 1632. Pertencia a uma família judia e inicialmente fez estudos puramente hebraicos. Mas ao aprender latim e ler Descartes, sentiu se desenvolver sua vocação filosófica. A sagacidade com a qual interpretou as escrituras levou à sua excomunhão pelos rabinos, que, graças a certas influências, conseguiram fazer com que ele deixasse Amsterdã. Spinoza se refugiou em Haia, onde viveu o resto de seus dias, inteiramente dedicado à meditação filosófica. Teve amigos ilustres e poderia ter obtido, com a ajuda deles, fortuna e honrarias. Recusou tudo isso para se manter independente. Pobre, mas protegido contra a miséria, ganhava sua vida talhando vidros de lentes de aumento. Morreu em Haia em 1677.